sábado, 19 de dezembro de 2009

Quero ser John Frusciante

Soube ontem que o John Frusciante deixou o Red Hot Chili Peppers. Se eu disser que não esperava é mentira. Há algum tempo, John disse em uma entrevista de rádio que já não tinha mais vontade de tocar em uma banda, e eu então já dava os Chili Peppers como terminados. Porque quando John Frusciante diz que não quer mais tocar, é porque ele não quer mais e não irá continuar. Não é a primeira vez que isso acontece.

O anúncio recente de que um novo álbum estava sendo feito e até mesmo que os Peppers iriam tocar em um show em homenagem a Neil Young reacendeu as minhas esperanças de que, afinal, a banda não estava morta. Porém, o medo voltou quando o baterista Chad Smith se recusou a falar de John em uma entrevista, se não me engano mês passado. Senti que algo de ruim estava acontecendo. Esta semana, o próprio John, que estava incomunicável há meses, escreveu em um blog que estava fora da banda. Já fazia um ano. Por um ano fui enrolado de que ainda havia esperanças, mas desde aquela entrevista de rádio que o John já não fazia mais parte dos Peppers. Só agora, porém, veio a confirmação definitiva do próprio.

Por total coincidência, quarta-feira passada aluguei o dvd do show que o Red Hot Chili Peppers fez no Slane Castle. Para ver pela milionésima vez. A primeira vez foi na tv, lá por 2004. Estava eu vendo um filme do 007 na TNT quando vejo o comercial do show. Iria ser exibido no canal dali há alguns dias. Entrei em êxtase: tratava-se da minha banda preferida, e eu nunca os havia visto ao vivo. Na verdade, fora os clipes, eu nunca havia visto os Chili Peppers em outros lugares. Apesar de serem imensamente populares, você não os vê na mídia muito, nem mesmo em entrevistas. Mas agora eu iria ver as pessoas por trás daquelas músicas em ação.

A TNT exibiu uma versão de 1 hora do show, apenas com as canções mais conhecidas. Quando a banda estava finalizando Scar Tissue, percebi que iria querer gravar aquilo. Devo ter visto aquele videocassete umas quantas vezes, e nunca me cansava. Principalmente por causa do John. Ouvir os Chili Peppers ao vivo não é como ouvi-los nas gravações: o John muda tudo, improvisa em todos os solos, cria introduções e finalizações que não existem na gravação original. No show do Slane Castle, todos os solos ganharam versões melhores, feitas de improviso no calor do momento. Aquilo era música gerada na hora, que para mim é a música verdadeira.

Nos intervalos, aparecia uma chamada de promoção que pedia para você ligar para um número e dizer porque o Red Hot Chili Peppers mudou a sua vida, ou algo assim, e você concorria a um cd da banda. Liguei para o número, sem esperança de atenderem. Atenderam. Fui pego de surpresa. "Então", disse a voz feminina do outro lado da linha, "qual é a sua resposta?". Tive que bolar algo de improviso. "Ah, o Red Hot Chili Peppers mudou a minha vida porque... porque eles me fizeram gostar de música". Não percebi na hora, mas, por mais boba e menos criativa que fosse, a frase era muito verdadeira, ainda que não houvesse como saber disso naquele momento. Eu só amo música do jeito que eu amo por causa daquele show. Por consequência, por causa dos Peppers. Ganhei o cd.

***

Um bom guitarrista não é aquele que consegue tocar super rápido, é aquele que consegue criar super rápido.  E nisso o John é mestre: sua capacidade de improviso é invejável, sua construção de frases musicais em perfeito enlace com os outros instrumentos é soberba. Nunca houve uma dupla com tanta sintonia como John e Flea. John sabe deixar espaços. As linhas de baixo de Flea preenchem com perfeição os espaços que o John deixa, e vice versa. No final é o conjunto, o groove, que chama a atenção, e não a guitarra individualmente.

Isso não se vê no rock, principalmente nas bandas onde o guitarrista toca seiscentas notas por segundo. John só precisa de três ou quatro, e elas se mesclam perfeitamente com os outros sons. Nenhum guitarrista faz isso, nenhum guitarrista tem essa caridade com os outros instrumentos. Isso faz a sonoridade da banda ser original, prova é que não há, até hoje, nada parecido com os Chili Peppers. Nenhuma banda repete essa temática de entrelaçamento de instrumentos como eles fazem.

O show do Slane Castle mudou a minha vida porque me fez amar a música e porque foi o responsável por eu ter comprado a minha guitarra. Eu queria ser John Frusciante. Nenhum outro guitarrista me interessava. Nenhuma outra banda significava o mesmo pra mim. Nunca me conectei com Beatles, Led Zeppelin ou qualquer banda clássica que todo mundo idolatra. Quando eu ouço Beatles, sinto que aquele som não é da minha época, não foi feito para mim. Parece algo vindo de uma realidade que não me pertence; pertença a meus pais, talvez, mas não à mim. Eu ouço o John tocando, e eu entendo. Entendo o que ele quer dizer, o que ele quer fazer e para onde ele vai. Aquela música é a minha música, da minha época, da minha realidade. É a trilha sonora da minha vida. Uma ligação assim com uma banda é algo muito bonito; espero que todos tenham a oportunidade de achar o seu som, assim como eu achei o meu. Ter essa conexão, conseguir sentir o significado da música, mesmo que as letras não façam sentido. Conseguir ver as cores da música. Isso é o mais perto que eu vi de magia nesse mundo.

John também tem essa conexão com a música. Ele passava dezesseis horas por dia tocando guitarra. Depois de um dia de dez horas de gravação, ele voltava para casa e ouvia música até adormecer. John não gostava de sair em turnê pois lhe desagradava ter de esperar horas para a montagem de palco: queria tocar assim que pudesse. Ele consegue compor uma osquestração de quatro guitarras mentalmente, sem nem por a mão em uma, como fez com Turn it Again. Como ele faz isso? Ao contrário de outros profissonais do ramo musical, John recusa-se a dizer que tudo já foi feito. "Música é infinita", ele costuma dizer, e é por isso que sempre consegue criar algo novo, não importa quando ou quantas vezes for preciso.

A fonte dessa magia secou, e eu soube disso ontem. Não há mais Chili Peppers como eu os conhecia. O meu heroi resolveu se aventurar por outros caminhos musicais. Diferente do pessoal que diz que está feliz por ele fazer o que gosta, eu não estou. Por mais genial que John seja, ele nunca conseguirá fazer sozinho o que fez com os outros três gênios. Era a conexão de mentes que fazia o troço ser especial. Agora não há mais isso, e não há o que fazer. Boa sorte para o próximo guitarrista dos Peppers: além de ter que se igualar com os outros três, ele terá a missão de substituir a maior mente musical da nossa época. Enquanto aguardo para ver o que vai ser da banda, ponho o dvd do Slane Castle pra tocar e relembro a melhor fase da melhor banda da minha vida.

5 comentários:

  1. Bonito, cara. Agradeçamos por ter vivido isso tudo e por Frusciante estar aí, vivo, pronto para se reinventar em cada novo trabalho.

    Para mim, o vídeo "mudador de vida" foi o Funky Monks, que registra a gravação do BloodSugar.

    Experimente vê-lo e depois me conte o que sentiu. E ouça o Niandra LaDes And Usually Just A T-Shirt, primeiro solo do cara. Seu mundo vira de cabeça pra baixo...

    Abraços,

    Marcio
    marciologia.blogspot.com

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  2. Eu amo esse dvd "Slane Castle", foi qdo vi o John pela primeira vez... o cara me encantou, parecia q eu via a alma dele... ele foi perfeito... desse dia em diante eu comecei a pesquisar sobre ele, eu nem sabia o nome dele.
    Depois q vi o John tive uma outra visão de música. Ele foi um divisor de águas na minha vida.
    Long life John Frusciante!!!!!!!!!

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  3. john tem um feeling especial pra guitarra. é uma pena que saia do red hot, mas ja estamos acostumados com a sina do rodizio de guitarras do rhcp. oasis sem noel, red hot sem frusciante. é a vida :/
    ps. red hot foi o que me fez começar a ouvir rock de verdade, mas naõ foi com o slane castle, foi com o by the way

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  4. É, o Red Hot Chili Peppers meio que representa pra nossa geração o que o Led Zeppelin representou para a dos nossos pais (embora eu também goste do Zeppelin -- Moby Dick! Dancing Days!): uma banda direta, pesada, sexual, perfeita pra adolescência. Além disso, o Frusciante é um gênio mesmo, não há como negar. Basta escutar os discos solo dele.

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  5. Poxa, suas hostorias batem bem com a minha ! Eu começei a tocar guitarra seriamente a uns 8 meses, mais tudo mudou desde que eu assisti ao Live in Slane Castle ... a sensação que rola naquele DVD chega a ser indescritivel ! Eu já tinha ouvido RHCP antes, mais nunca tinha prestado atenção naquilo, e juntando aquela fase de aprendizado, com o que John nos mostra, me deu outro rumo na guitarra. Eu sempre ouvi que pra ser um bom guitarrista tinha que ser igual a Malmsteen , tudo bem , eu respeito as horas dedicadas ao instrumento , mais John Fruscinante sabe fazer daquilo que muitos julgam ser simples, uma coisa unica! É incrivel o que John consegue fazer com algo tão simples ! Estou me dedicando dia após dia , para quem sabe me tornar um cara tão bom que nem John . Assim como ele mudou a minha vida, em relação a musica, acredito que o mesmo ocorreu com vocês .

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