domingo, 17 de janeiro de 2010

Histórias de Verão

1. BIA

Disse que seu nome era Bia, e ficou esperando por uma reação. O homem demorou um pouco para se lembrar. Ah, claro, a Bia do colégio!

- Bia! Quanto tempo!

- É! Faz uns vinte anos.

Eram colegas no ensino médio. Não se viam desde a formatura. Ela estava radiante, a Bia. Estava realmente feliz em reencontrá-lo. E, vestida naquele biquíni branco, estava um espetáculo. Há mais prazeres que a praia proporciona do que o sol e o mar. Revelar as curvas seminuas das mulheres é um deles.

- Veraneia sempre aqui?

- Pois é, é a minha primeira vez.

- Está gostando?

- Sim, sim. O mar é ótimo.

Continuaram conversando amenidades à beira-mar. Ele pensando, ela não envelheceu um dia sequer. Bia continuava como se ainda fosse uma adolescente na flor da idade. Bem diferente da sua mulher, que estava neste momento tomando sol ao seu lado. Torcia para que ela não percebesse a chegada de Bia. Casara-se muito cedo. Antigamente era bonita, até, a sua mulher, mas mais velha que ele. Pior, acabou deteriorando-se muito rápido. O tempo não é algo saudável para algumas pessoas. Estava decrépita, com uma aparência uns dez anos mais velha do que a realidade. E não fora só sua beleza que se perdera. Se antes era simpática, agora estava insuportável. Não era um casamento feliz. Se não fossem os dois filhos, o homem consideraria o divórcio, mas acabara se conformando com sua vida. Isto é, até Bia aparecer minutos atrás no seu biquíni branco.
A esposa, que estava tomando sol num estado de semi-torpor, levantou a cabeça para ver que som de conversa era aquele.

- Beto! Quem é essa?

Pronto, pensou ele. A besta despertou. Bia olha para ela, como se acabasse de perceber que ela e o homem estavam juntos, e pergunta o óbvio:

- Ah! Vocês dois estão juntos?

Ele olha para uma, depois para a outra. Sentia-se no meio de uma encruzilhada, prestes a decidir o caminho do resto de sua vida. Só dependia de para quem respondesse primeiro. Podia escolher uma vida de decepção com sua mulher, ou uma chance dourada de novas oportunidades com Bia. Virou-se para Bia:

- Ah, essa aí é a minha mãe. Eu trouxe ela para veranear comigo. O médico disse que o sol faria bem pra ela.

- Como é que é, Beto?!

A mulher olhava pra ele, boquiaberta.

- Ah, não enche, mãe! Com licença, que eu e a Bia vamos sair para tomar uma água de coco. - e, virando-se novamente para Bia - Aceita?

Ela faz que sim com a cabeça, sorrindo. Os dois vão embora, sob o olhar estupefado da esposa. Agora foi, pensou Beto. O jeito é aproveitar.


2. O VELHO SURFISTA

O Tadeu e o Milton morreram de rir quando o Otávio apareceu na praia caracterizado de surfista: bermuda de surfe, colar de surfista e, é claro, a prancha. Estavam todos no lado mais curto dos quarenta, e nenhum deles tinha a menor conexão com o mundo do surfe. Quanto mais o Otávio.

- Qualé, Otávio? Deu pra virar surfista nessa idade? - perguntou o Tadeu, ainda rindo.

- Vocês não entenderam nada. É pra pegar as menininhas. - defendeu-se o Otávio. E acrescentou: - elas gostam.

- Ah, e você acha que só posar de surfista vai adiantar alguma coisa? - questiona o Milton.

Antes do Otávio responder, é abordado por três meninas de seus dezenove anos, que vieram puxar papo com ele. Os dois amigos observaram o desenrolar da conversa, impressionados. Otávio dizia para elas que surfava desde jovem, e agora buscava o seu eu entre as ondas. As meninas perguntavam sobre a prancha. Essa prancha?, dizia o Otávio. É uma semi long-short seis ponto dois quartos. As meninas sorriam, impressionadas. Queriam ver o Otávio em ação. Por que ele não ia surfar agora?

O Otávio olhava para os surfistas no mar e balançava a cabeça negativamente. Disse:

- Esses aí surfam qualquer coisinha. Estou esperando pelas ondas boas.

E as meninas se derretiam.

Quando elas foram embora, o Otávio explicou para os amigos que existia um tipo de mulher que era vidrada em surfista. Era só essas mulheres verem um surfista que saíam correndo atrás. O Otávio, diferente do Milton e do Tadeu, não tinha barriga, se cuidava, ia à academia. Dava pra enganar como surfista.

- Dá muito certo - explicou. - o segredo é só ficar longe do mar.

No outro dia, o Milton apareceu com uma prancha de bodyboard. De isopor.

- Que é isso? - ria-se o Otávio. - você acha que vai enganar alguém com isso? E com essa barriga, ainda por cima?

O Milton disse que vira a pranchinha por 30 reais no caminho da praia, e lembrou-se do Otávio. Deu de ombros.

- Não custa tentar.


3. A VOLTA DO EDSON

O Edson nunca estava satisfeito com o que tinha. Era essa a conclusão de seus amigos. Mas chegaram a pensar por um momento que dessa vez ele tomaria jeito. Convidara a Sandra para veranear com eles, algo que faziam todos os anos. Talvez, pensaram, o Edson se acomodasse com a Sandra.

***

Estavam o Téo, o Jorge, o Silva, o Edson e a Sandra na praia. O Téo deu a ideia de o grupo dar uma volta pela beira do mar, só pra se mexer, mesmo. A Sandra preferiu ficar tomando sol. O Edson disse que ia e já voltava, ela disse pra ele voltar logo, amor, e os dois se deram um longo e apaixonado beijo.
Assim que se afastaram o suficiente, o Edson disse:

- Tá legal, preciso de ajuda pra me livrar dela.

O Jorge soltou um palavrão. O Téo disse algo como "de novo, Edson?". O Silva não disse nada. O Silva não falava muito.

- Deixa eu me explicar. A Sandra é superlegal, é linda...

- Ela é perfeita pra você! - exclamou o Jorge.

- Deixa eu me explicar, pô! Tá, ela é legal e tal, e eu realmente achei que a gente ia dar certo juntos. Não havia o que dar errado: a mina tinha tudo o que eu queria numa mulher. Só que...

- Só que o quê?

- Vocês não notaram uma coisa nela nesse verão?

Não. Ninguém notara. A Sandra continuava tão perfeita quanto sempre fora. O Edson notara.

- Vocês sabem que a Sandra anda muito de tênis. Anda sempre de tênis. Tanto que eu vi o pé dela pela primeira vez aqui na praia. Vocês viram o pé dela, não viram?

Não, ninguém vira. O Edson mandou o grupo se aproximar, como quem conta um segredo:

- Ela tem dedos gordos.

O Jorge gritou um "ah, para!" tão alto que assustou o Edson, que estava falando baixinho. Os outros também estavam indignados. Pediam explicações.

- É um pé gordo! É um pé gordo! - exclamava o Edson, como se fosse lógico. - eu não posso namorar uma mulher sabendo que ela tem um pé gordo. Mesmo que ela coloque um tênis, eu ainda vou saber que ali estão aqueles dedos gordinhos, escondidos, me olhando... não dá.

- Edson, pensa bem no que você está fazendo, terminando com ela só por causa do pé... - argumentou o Téo.

- Não dá, cara. Você sabe quais são os meus critérios.

Ah, sim. O Edson tinha os seus critérios. Eram características que todas as suas namoradas deveriam ter.

- E então, Téo? Você lembra quais são os meus critérios?

O Téo suspirou. Repetiu, como uma criança que repete uma conjugação de verbo no pretérito perfeito que acabou de decorar:

- Ter menos de um metro e setenta, cabelos no mínimo na altura dos ombros e pés bem cuidados.

- Exato! E pés com dedos gordos não se enquadram como pés bem cuidados. - sentenciou.

Os amigos diziam para ele não fazer isso, para esperar pelo menos até o término do verão, mas o Edson estava decidido. Não estava pedindo uma opinião, estava relatando a sua decisão.

- Eu também queria que tivesse dado certo. Mais do que vocês. Mas não dá pra namorar alguém que tenha um pé daqueles. Por mais que o resto do corpo seja bom, vai sempre existir aquele pé pra me atormentar. Desculpem. Inclusive, vou lá agora mesmo acabar com isso.

E ele deu meia-volta em direção à Sandra. Quando o Edson já estava longe, o Silva disse que era uma boa considerarem procurar novos amigos.

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