terça-feira, 10 de novembro de 2009

O Gorba

Pobre Gorbachev. Cada vez que alguém lhe dá os parabéns por ter desmantelado a União Soviética, ele deve dar um sorriso e, por dentro, se segurar para não socar a pessoa. Ontem, no evento comemorativo dos 20 anos da queda do Muro, quando a chanceler alemã Angela Merkel agradeceu publicamente a ele por ter deixado os eventos finais da Guerra Fria acontecerem sem intervir, Gorba deve ter sorrido o seu milésimo sorriso irônico. Mais uma vez, estavam expondo em rede mundial a sua incompetência em reformar a URSS e em virar a guerra. Incompetência, sim. Se as reformas políticas propostas por ele tivessem saído conforme o plano, a URSS, em primeiro lugar, ainda existiria, e seria algo parecido com a China de hoje: uma república comunista, porém com um mercado aberto e crescimento econômico acelerado. O negócio deu tão errado que em um espaço de tempo curtíssimo já não existia nem mais uma URSS para ser salva.

Gorba virou heroi por ter falhado em sua missão. Analisando friamente, as pessoas na verdade lhe dão os parabéns por ter sido um governista incompetente. Até lhe deram um prêmio por isso. O Prêmio Nobel ganho por Gorbachev foi o maior prêmio joinha da história. Foi mais ou menos como, "ei cara, você fez a gente ganhar a guerra! Tá bom que pra isso você teve que perder, mas, uau, isso é muito legal! Valeu!", seguido por umas palmadas nas costas. Muito bem, Gorba. Muito bem.
Lech Walesa, antigo chefe do sindicato polonês Solidaridad, recentemente tirou o mérito da queda do Muro de Berlim de Gorba. Disse ele que o responsável pela queda foi o Papa João Paulo II, o próprio Walesa e em, certa medida, o resto do mundo, mas não Gorba. Agora nem reconhecem mais o mérito de ele não ter feito nada para salvar a Alemanha comunista. Coitado. Nem pela sua incompetência ele pode ser parabenizado.

Dito isso, quero que fique claro que, mesmo sendo responsável pela derrota da URSS, eu admiro o cara. É sério. Sou fã do Gorba. A missão dele era difícil. A Guerra Fria já se arrastava por décadas. A URSS, depois do atoleiro que foi o Afeganistão, já estava sem recursos. Ao perceber que suas reformas serviram para acelerar a queda do comunismo, ao invés de fortalecê-lo, Gorba não tentou lutar contra: admitiu a derrota. Na queda do Muro, ele poderia se meter e acabar com a festa geral, mas não o fez. É como um homem preso em alto mar: ele pode nadar, mas sabe que cedo ou tarde irá cansar e se afogar. Gorbachev soube na hora que era inútil continuar nadando. Não esperou se cansar. Afundou, sim, mas com honra. Afinal, já que é para ser assim, ao menos afundemo-nos nós mesmos.

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